Juliano Loureiro • mai. 14, 2021

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O gênero lírico é um dos mais antigos e admirados entre os literários, graças ao seu apego emocional e uma narrativa livre, digamos assim, que permite as expressões de sentimentos e emoções em inúmeras formas. Tudo graças a uma certa quantidade de subgêneros líricos.


Por mais que esses subgêneros sejam classificados pela estrutura dos poemas e suas métricas, isso também reflete no gosto dos leitores.
Alguns preferem uma leitura mais fluida, com blocos textuais maiores - mesmo falando-se de versos -. Outros apreciam não só a escrita, mas a diagramação do texto também é objeto de adoração.


Seja por qual motivo for, conhecer os gêneros que compõem o lirismo é de suma importância para poetas, iniciantes ou não, poderem expandir a criatividade pela poesia. É claro que, bem antes de entender os subgêneros, deixo a indicação de leitura sobre o gênero que os abraça: “
Gênero Lírico: aprenda o que é e quais são as suas principais características”. 


Agora, conheçamos mais sobre cada um desses subgêneros líricos, o que são, quais suas diferenças e exemplos. Boa leitura!

Soneto

Começaremos pelo subgênero mais famoso e que surgiu lá na Itália. Apesar de não ser 100% confirmado, estudos apontam que o poeta e humanista italiano Francesco Petrarca (1304-1374) foi o criador desse subgênero.


Soneto, em italiano sonetto, significa “pequeno som”. E, nada mais justo, tendo em vista que uma das principais características é a presença constante da rima. Outra marca que caracteriza o soneto é a sua estrutura em 14 versos, sendo 2 quartetos (estrofes com 4 versos) e 2 tercetos (estrofes com 3 versos).


O gênero lírico tem uma pegada tão grande na subjetividade que até seus subgêneros têm sub subgêneros. Prova disso é o próprio soneto, que apesar da característica mais comum citada acima, ainda tem o soneto inglês criado por ninguém menos que Willian Shakespeare, com 3 quartetos e 1 dístico (estrofe de 2 versos).


Há também os sonetos: monostrófico, com uma única estrofe composta pelos catorze versos. E o estrambótico, que conta com versos ou estrofes adicionais.

Soneto de Luís de Camões

“Amor é fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói, e não se sente;

É um contentamento descontente;

É dor que desatina sem doer.


É um não querer mais que bem querer;

É um andar solitário entre a gente;

É nunca contentar-se de contente;

É um cuidar que se ganha em se perder.


É querer estar preso por vontade;

É servir a quem vence, o vencedor;

É ter com quem nos mata, lealdade.


Mas como causar pode seu favor

Nos corações humanos amizade,

Se tão contrário a si é o mesmo Amor?”

Ode e Hino

Por que eu falarei de dois subgêneros em um único tópico? Porque eles são praticamente a mesma coisa, muda-se apenas o homenageado pela poesia. 


Ambos são poemas de exaltação e homenagens a personagens, algo ou alguém (ode) ou nações e entidades religiosas (hino).


Sobre as odes, ressaltarei que em sua origem, os poetas gregos dedicaram odes aos deuses, aos atletas, guerreiros e heróis. Mas, houve também aqueles que homenagearam os sentimentos, como o amor e outros prazeres. E aí, você está se perguntando como seria uma ode a algo. Seria a um objeto? 


Sim, Pablo Neruda, um dos maiores nomes da literatura mundial e referência da ode latino-americana, escreveu odes às meias e às cebolas. Duvida? Pois aí vai um belo exemplo de ode:

Ode de Pablo Neruda

Ode à cebola (trecho)


Cebola

luminosa redoma,

pétala por pétala

cresceu tua formosura,

escamas de cristal te acrescentaram

e no segredo da terra escura

arredondou-se teu ventre de orvalho.

Sob a terra

foi o milagre

e quando apareceu

teu lento caule verde

e nasceram tuas folhas como espadas na horta,

a terra acumulou seu poderio

mostrando tua desnuda transparência,

e como em Afrodite o mar remoto

duplicou a magnólia

levantando seus seios,

a terra

assim te fez

cebola

clara como um planeta

e destinada a reluzir,

constelação constante,

redonda rosa d’água,

sobre a mesa

das gentes pobres.

(...)


Ainda sobre as odes e deixando de lado as tradicionais em homenagens às personalidades, vou falar sobre uma que foi de grande inspiração para uma das maiores composições da música clássica mundial.


O poeta e escritor alemão Friedrich Schiller compôs
Ode an die Freude, que em português é Ode à Alegria, ou somente À Alegria. E tal poema foi parar em meio à composição mais importante de Ludwig van Beethoven; a Nona Sinfonia, ou simplesmente A Nona.


Parte do poema de Schiller foi incorporado ao último movimento da sinfonia, com o texto cantado por solistas e um coro. E, como se ainda não bastasse, todo o último movimento da
A Nona  foi rearranjado por Herbert von Karajan para se tornar o hino da União Europeia, em 1985.

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Hinos

Os mais conhecidos hinos são, com certeza, os “hinos nacionais”. E, quando se sabe ao menos um deles, fica fácil perceber as principais características desse subgênero lírico. A grosso modo, o hino nada mais é que uma ode de exaltação a um país ou nação. 


Mas tão famoso quanto os hinos nacionais, estão os hinos de louvor religiosos. Talvez, a associação de santos e santas como “heróis” e/ou personagens, nos fazem entender o hino religioso mais como uma ode. Mas, uma lida com mais calma nos materiais religiosos, percebemos os inúmeros hinos entoados nas igrejas.

Trecho de A Portuguesa - Hino de Portugal

Heróis do mar, nobre povo

Nação valente, imortal

Levantai hoje de novo

O esplendor de Portugal!

Entre as brumas da memória

Oh, Pátria, sente-se a voz

Dos teus egrégios avós

Que há de guiar-te à vitória!


Às armas, às armas!

Sobre a terra, sobre o mar

Às armas, às armas!

Pela Pátria lutar

Contra os canhões

Marchar, marchar!


Desfralda a invicta bandeira

À luz viva do teu céu!

Brade a Europa à terra inteira

Portugal não pereceu

Beija o solo teu jucundo

O oceano, a rugir d'amor

E o teu braço vencedor

Deu novos mundos ao mundo!

(...)

Sátira

Eis aqui um dos mais famosos gêneros literários e que muita gente não sabia estar no gênero lírico, não estou certo? Mas essa confusão é comum, porque a sátira pode ser encontrada em verso ou prosa.


O que não muda é a sua premissa de criticar e ridicularizar sejam pessoas ou situações, como também os costumes morais, políticos e hábitos. 


Nem sempre o objetivo de uma sátira é o riso do leitor, mas sim a desmoralização de alguns conceitos, por isso a sua narrativa é repleta de ironia e sarcasmo. 


Para ilustrar como o humor sempre serviu como crítica social, apresento um exemplo da sátira brasileira com um dos maiores nomes da nossa literatura.

Poesia satírica de Gregório de Matos

Epigrama (trecho)


Que falta nesta cidade?... Verdade.

Que mais por sua desonra?... Honra.

Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.


O demo a viver se exponha,

Por mais que a fama a exalta,

Numa cidade onde falta

Verdade, honra, vergonha.


Quem a pôs neste rocrócio?... Negócio.

Quem causa tal perdição?... Ambição.

E no meio desta loucura?... Usura.


Notável desaventura

De um povo néscio e sandeu,

Que não sabe que perdeu

Negócio, ambição, usura.


Quais são seus doces objetos?... Pretos.

Tem outros bens mais maciços?... Mestiços.

Quais destes lhe são mais gratos?... Mulatos.


Dou ao Demo os insensatos,

Dou ao Demo o povo asnal,

Que estima por cabedal,

Pretos, mestiços, mulatos.

(...)

Elegia

Esse subgênero lírico caracteriza-se mais pela sua temática do que propriamente pela sua forma. Apesar das primeiras elegias apresentarem um padrão de dísticos formados de versos hexâmetros, ela se popularizou com seus versos livres.


Então, qual a principal característica da elegia? Como dito, a temática de uma elegia permeia sempre os sentimentos ligados à tristeza, melancolia, luto, perda de amores pela morte ou infidelidade.


Entre os principais nomes da elegia figuram Camões e os brasileiros Fagundes Varela, Drummond e Bandeira.


Elegia para minha mãe (trecho) - Manuela Bandeira


Nesta quebrada de montanha, donde o mar

Parece manso como em recôncavo de angra,

Tudo o que há de infantil dentro em minh'alma sangra

Na dor de ter visto, ó Mãe, agonizar!


Entregue à sugestão evocadora do ermo,

Em pranto rememoroso o teu lento matírio

Até quando exalaste, à ardente luz de um círio,

A alma que se transia atada ao corpo enfermo.


Relembro o rosto magro, onde a morte deixou

Uma expressão como que atônita de espanto

(Que imagem de tão grave e prestigioso encanto

Em teus olhos já meio inânimes passou?)


Revejo os teus pequenos pés... A mão fransina...

Tão musical... A fronte baixa... A boca exangue...

A duas gerações passara já teu sangue,

 - Eras avó -, e morta eras uma menina.


No silêncio daquela noite funeral

Ouço a voz de meu pai chamando por teu nome.

Mas não posso pensar em ti sem que me tome

Todo a recordação medonha do teu mal!

Écloga e Idílio

A vida simples no campo e o bucolismo ganharam espaço no gênero lírico graças à écloga. O estilo de vida rústica, ambientada no meio rural, é descrito em poemas e poesias, em sua grande maioria através de diálogos ou monólogos.


Os personagens das éclogas, como não poderia deixar de ser, eram os pastores e a narrativa, quando não remetia à vida pastoril, falava sobre amores. O grego Teócrito (310 a.C. – 260 a.C.) é conhecido como pai do gênero, tendo produzido as primeiras peças éclogas.


Com o passar dos anos, o subgênero lírico permitiu-se às adaptações e os pastores cederam por diversas vezes espaço para pescadores, mas sempre se referindo ao estilo simples da vida do trabalhador campestre ou da pesca.


As éclogas também representaram pessoas e situações reais e ganharam adaptações para encenações teatrais. Mas, se a écloga evoluiu tanto, foi graças ao idílio.


Idílio é um subgênero da lírica grega com uma temática amorosa com protagonistas pastores ou campesinos, em um ambiente campestre, com toda aquela áurea bucólica que mencionei ao falar da écloga.


Para os antigos gregos, um idílio era qualquer poema curto que descrevesse a vida no campo e como viviam seus personagens. E o ponto de partida de tudo isso é com o já mencionado poeta Teócrito.

Haicai

Ainda no campo do bucolismo, apresento agora um subgênero lírico de origem japonesa, com uma forma fixa e como características principais (e originais) a ausência de títulos e rimas. O haicai é uma poesia objetiva e sintética, no Brasil, alguns dos seus principais representantes são Paulo Leminski e Millôr Fernandes.


Com relação à forma, os haicais tradicionais são compostos por 17 sílabas e 3 versos, divididos da seguinte maneira: o primeiro e o terceiro são redondilhas menores — versos de cinco sílabas —, e o segundo, redondilha maior — verso de sete sílabas.


Outras características presentes no haicai: simplicidade, serenidade, sobriedade, casualidade, solidão, anti sentimentalismo, kigo e cesura. Com certeza, você deve estar se perguntando o que são cesura e kigo.


Cesura nada mais é que uma palavra utilizada, no final do primeiro ou do segundo verso, para dar uma quebra sintática ao poema, com isso, o texto não fica parecendo uma única sentença. Já kigo, é uma palavra ou expressão utilizada para evidenciar em qual estação do ano o texto foi produzido.


Para ilustrar, nada melhor que um exemplo do principal representante do haicai tradicional japonês escrito em território brasileiro, Masuda Goga:


Em cima do túmulo,

cai uma folha após outra.

Lágrimas também...


Apesar das características apresentadas, aqui no Brasil, os poetas não levaram as regras tão a sério. Paulo Leminski, por exemplo, produziu um haicai com o primeiro e o terceiro versos com três sílabas poéticas, enquanto o segundo verso possui cinco:


lua à vista

brilhavas assim

sobre auschwitz?

Epitalâmio

Para terminarmos nosso estudo sobre os subgêneros líricos, o epitalâmio talvez seja o único gênero feito para uma ocasião em especial, uma ocasião programada: o casamento.


O epitalâmio, mais que um poema, é um cântico usado para reivindicar as bênçãos dos deuses ao casal. A principal divindade aclamada nesses cânticos era Himeneu, filho de Apolo e deus grego do casamento.


Agora que você já conhece um pouco mais sobre o gênero lírico e seus subgêneros, fica mais fácil aventurar-se pela poesia, não é mesmo?


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Juliano Loureiro; escritor, profissional de marketing e produtor de conteúdos literários.


Criei o Bingo em 2019 para compartilhar conteúdos literários com outros escritores, que também têm dúvidas sobre como escrever e publicar um livro. 


Já escrevi mais de 900 artigos, além de diversos e-books gratuitos. Na minha jornada literária, publiquei 6 livros, sendo 3 da série pós-apocalíptica "Corpos Amarelos".


Também sou criador do Pod Ler e Escrever, podcast literário com mais de 200 episódios publicados. 


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